Restauração florestal na Mata Atlântica é aliada para negócios locais

abril, 19 2021

Parceria entre WWF-Brasil e International Paper viabiliza plantio de mudas nativas em propriedades de São Paulo e Minas Gerais.
Proprietários rurais que atuam na região da Mata Atlântica, entre os estados de São Paulo e Minas Gerais, estão contando com apoio técnico e suporte para restauração florestal em suas propriedades.

Por WWF-Brasil


Trata-se do programa Raízes do Mogi Guaçu, uma cooperação de quatro anos firmada entre a International Paper e o WWF-Brasil que visa superar os conhecidos obstáculos, como a falta de apoio técnico à restauração com espécies nativas. A execução é feita pela Associação Ambientalista Copaíba e IFEAC, empresa júnior do Instituto Federal Sul de Minas - Núcleo Inconfidentes, referência em restauração ecológica. 

A expectativa dessa atuação em rede é que, até 2024, sejam restaurados pelo menos 200 hectares no entorno das nascentes e áreas ripárias do Rio Mogi Guaçu entre o Sul de Minas e São Paulo. O objetivo final é garantir condições para a provisão e resiliência hídrica das propriedades da região e da bacia hidrográfica como um todo.
 
Edegar de Oliveira, diretor de conservação e restauração do WWF-Brasil, afirma que o projeto aponta para a importância da colaboração entre iniciativa privada, produtores, institutos de pesquisa e sociedade civil para resgatar serviços ecossistêmicos fundamentais. "Essa atuação conjunta em uma agenda tão inspiradora, a restauração ecológica, é um passo na construção de um legado em cada propriedade e na bacia como um todo, beneficiando não só os produtores, mas toda a região atendida pelo Mogi", comenta. 

A iniciativa está inserida na Década da Restauração de Ecossistemas, instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), que propõe a adoção de medidas que combatam a crise climática e a perda da biodiversidade, que impactam diretamente na segurança alimentar e hídrica. O programa também conta com a rede de articulação das coalizões do Conservador da Mantiqueira e Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, no qual o WWF-Brasil faz parte do conselho, ambos com metas ambiciosas para restauração da Mata Atlântica, e que estão em constante troca e aprendizagem com os atores do projeto. Para Daniel Venturi, analista de conservação e restauração do WWF-Brasil, "a ação evidencia a urgência da discussão sobre crise hídrica e a necessidade de recuperação de paisagens indispensáveis para a vida saudável das pessoas que ali habitam e trabalham, dos setores produtivos e da biodiversidade”, ressalta.

Mariana Claudio, Especialista de Sustentabilidade da International Paper, reforça que a rede de parcerias é a chave para o desenvolvimento sustentável: “O Programa Raízes é para nós, mais do que um projeto, é a forma de expressarmos o nosso propósito. A IP trabalha diariamente para sustentar florestas saudáveis e abundantes a longo prazo. A grande rede de parcerias criadas, o engajamento de todos os envolvidos e os benefícios sociais e ambientais são, para nós, a única forma possível de promover o desenvolvimento sustentável. É muito especial e único poder trabalhar lado a lado com tantos atores diferentes e que acreditam nessa transformação”, afirma.

O programa até agora (março/21) está com 64 hectares em restauração. Aproximadamente 66.000 mudas já foram plantadas e 37 nascentes protegidas pelas equipes da Copaíba, na sub-bacia do Peixe, e pelo IFEAC /IF Sul de Minas Gerais - Núcleo Inconfidentes, na sub-bacia do Alto Mogi. Em parceria com 18 proprietários, diferentes técnicas de restauração foram adotadas em áreas prioritárias para provisão hídrica nos municípios paulistas de Socorro, Serra Negra e Águas de Lindóia, além dos municípios mineiros de Inconfidentes, Bueno Brandão e Monte Sião.  Nos relatos de quem participou, destaca-se o impacto positivo sobre a produção de água, bem como a redução no uso de insumos químicos e a obtenção de produtos de maior valor agregado. Além de contarem com uma rede de suporte técnico e de troca de conhecimento.

Ana Paula Balderi, coordenadora da Copaíba enfatiza a facilidade e os benefícios para propriedades que aderem ao projeto. Cabe à Copaíba a produção, plantio das mudas e a articulação com proprietários locais, incluindo o suporte técnico, a entrega de material da cerca, o preparo da terra, o plantio das mudas e as primeiras manutenções. Aos donos de terra que aderem, cabe o apoio com a mão de obra para colocação da cerca e a manutenção da plantação. 

Ana lembra que a inclusão do Sul de Minas Gerais, região de fundamental importância para a manutenção dos rios regionais, é um dos pontos que fortalece o Raízes do Mogi Guaçu. “Sempre tivemos ações para desenvolver a restauração em São Paulo, ficamos mais felizes em poder beneficiar o sul mineiro que deságua suas águas no Rio do Peixe, favorecendo a região”.



Outro aspecto importante do projeto é o fato de ser executado com mudas de espécies nativas da Mata Atlântica, produzidas a partir da coleta de sementes de árvores da própria região, o que assegura inúmeros ganhos, como viabilidade genética, facilidade de adaptação das espécies, contribuindo com a perpetuação da flora local, aumentando a proteção da biodiversidade, recomposição dos habitats naturais, equilíbrio climático, melhora da qualidade do ar, redução de erosão e deslizamentos, além de retenção de poluentes da atmosfera. 

Dentre os proprietários que aderiram ao programa estão: Ellen Souza Pinto Fontana, produtora de café especial em Socorro/SP; os sócios Paulo Araújo e Mariana Mota - que investem na produção agroflorestal com cultivo de café especial; José Fernandes - que trabalha com turismo rural sustentável em seus quatro hotéis na região, e André Jardim - que reflorestou uma área para recuperar uma nascente em sua propriedade. 

Cafés especiais produzidos na Mata Atlântica de São Paulo
Ellen Souza e os sócios Paulo Araújo e Mariana Mota fazem parte de um grupo cada vez mais crescente de produtores que tentam manter o equilíbrio ambiental para agregar valor ao produto. Ambos recebem apoio do programa Raízes do Mogi Guaçu para realizar o reflorestamento em suas propriedades.

Paulo Araújo e Mariana Mota adquiriram a propriedade em 2012 e passaram a atuar com agricultura natural  e orgânicos na região da Serra Mantiqueira (SP). Eles plantam café, macadâmia, ingá, cedro australiano e banana. Em 2018, fizeram a transição de produção orgânica para o sistema agroflorestal, pois viram uma oportunidade de redução de custos, considerando que a floresta tem um sistema de manutenção natural que dispensa boa parte dos fertilizantes. 

Impressionados com os resultados do ponto de vista ecológico, eles estão associando outras alternativas para potencializar a produtividade, aderindo assim, à restauração florestal. Os proprietários querem recuperar uma nascente, reflorestar uma área de antigo cafezal e fazer adensamento em outras áreas com 3.200 mudas num espaço de quase três hectares.

Ainda em período de transição, estimam obter 15 sacas do café especial por hectare na primeira safra, com um preço superior ao mercado tradicional. Com marca própria, venda direta em plataforma online e distribuição direta, o Café dos Contos firmou parceria com uma rede de café em Londres. Segundo Paulo, “a aliança ocorreu por conta de uma grande mudança global em relação à agricultura. As pessoas estão mais atentas ao tipo de cadeia produtiva, da qual provém os alimentos que elas consomem, há rejeição aos defensivos agrícolas e tudo que causa danos ao meio ambiente. Há um movimento crescente de valorização do que é sustentável. Estamos diante de um paradigma de aliar  produtividade a um sistema que regenere o meio ambiente, que traga ganhos ambientais”, ressalta. Em 2019, o Café dos Contos ganhou o prêmio Novo Agro do Santander e Esalq, na categoria Sustentabilidade/Pequeno produtor.

Ellen, por sua vez, é a quinta geração a estar na propriedade de 50 hectares em Socorro (SP). A família produz banana, abacate, eucalipto e café. Atualmente, vende parte da produção de café para a Austrália, por intermédio de parceiros. Desde 2020, restaurou com o Projeto Mogi Guaçu cerca de 1 hectare com 1.400 mudas. A proprietária acredita que o retorno financeiro está aliado à forma como realiza o trabalho. “Buscamos agregar valor ao produto, pois o custo com a produção do café tradicional não compensa. Mudamos a maneira de cuidar do café, com atenção desde o plantio até a colheita selecionada com pano, aplicando o grau de maturação adequada, cuidando separadamente de cada lote. Tudo isso com o intuito de preservar a qualidade do produto”, ressalta.

A proprietária faz a relação da sua produção com a restauração. “Eu acredito que quanto maior o equilíbrio, melhor a lavoura fica, menor incidência de pragas e doenças, menos uso de defensivos, mais diversidade e harmonia no plantio. E isso impacta no sabor natural do grão. Quem compra o nosso produto reconhece todo o trabalho que realizamos”, afirma.



Restauração florestal em hotéis
José Fernandes Franco, engenheiro agrônomo, possui quatro hotéis na região de Socorro (SP) e Bueno Brandão (MG).  Seu projeto pioneiro, em 1994, chamado Plante ou Adote uma Árvore, no Hotel Campo dos Sonhos, visava compensar o impacto ambiental de cada visita. Cada hóspede plantava uma árvore, colocava o seu nome e uma dedicatória, e até hoje retornam para revistar sua plantação. O proprietário reconhece que o trabalho com turismo rural, de aventura e ecoturismo exige preservação. “O atrativo real é a natureza do lugar, suas matas, águas, flora e fauna. É ela que gera experiências e cativa o visitante. De uns tempos para cá, percebemos que as pessoas estão buscando mais a natureza, por isso, mais do que antes, nosso trabalho de conscientização e de lazer é tão importante”, afirma.

Franco afirma que a vida rural, com suas plantações e dinâmicas próprias, oferece assuntos variados para educação ambiental, por isso os hotéis recebem visitas de escolas para tratar de assuntos como botânica, reprodução animal e vegetal, energia, importância da água e da mata. Ele utiliza o que a natureza oferece para aumentar a rentabilidade de seus negócios. Ao todo, já plantou mais de 60 mil árvores em seus empreendimentos e emprega aproximadamente 260 pessoas.

Nascido em Socorro, o proprietário vem trabalhando com restauração florestal há mais de 20 anos. Ao longo desses anos, ele recebeu apoio da Copaíba, que o convidou para o Programa Raízes do Mogi Guaçu, contemplando o Hotel Colina dos Sonhos, localizado na divisa entre Socorro e Bueno Brandão. A propriedade possui uma área grande com matas e minas de água que contribuem para rios da região. Até o momento, plantou 6 mil mudas no entorno de uma mina que precisava ser revitalizada. 

Plantando água
André Jardim é proprietário da Frutos da Paineira, em Bueno Brandão (MG). Ele e sua esposa Júlia Prates adquiriram a área em 2020, e procuram aliar a produção de alimentos com a natureza. Sua propriedade possui 60 mil metros quadrados, com uma parte ocupada por mata nativa. Implantou o sistema agroflorestal integrando a mata com o plantio de banana, café, macadâmia, abacate e frutas cítricas.

Além da produção, o proprietário está esperançoso em recuperar uma nascente que existe no sítio. Ele acredita que plantando árvores, colabora para a recuperação da nascente que  está desativada há mais de 20 anos e tem poucas árvores no entorno. “Aderimos ao projeto e plantamos 4.300 mudas que representam nossa esperança de ter mais água na propriedade. Achamos que o sistema integrado é mais resistente às pragas, favorece a dinâmica natural da mata e que não é necessário desmatar para produzir”. Com mais águas e maior produtividade, o casal já faz planos de aquisição de terras vizinhas. 
Árvore nativa sendo plantada em área de restauração ambiental
© Adriano Gambarini / WWF-Brasil
Ana Balderi, uma das fundadoras da Copaíba, no viveiro de mudas da instituição
© Adriano Gambarini / WWF-Brasil
Ellen Fontana, produtora de café na cidade de Socorro (SP) e participante do Programa Raízes do Mogi
© Adriano Gambarini / WWF-Brasil
José Fernandes, proprietário da Rede dos Sonhos Hotéis Fazenda
© Adriano Gambarini / WWF-Brasil
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