Ministros chegam a Nagoia para negociações na COP 10

outubro, 26 2010

Apesar dos impasses nos debates, ministros de países signatários chegam a Nagoia e trazem a esperança de que negociações bilaterais colaborem para um bom acordo na COP 10. Em evento paralelo, resultados do maior programa de conservação da biodiversidade, o Arpa, são apresentados.

Ligia Paes de Barros, de Nagoia
WWF-Brasil

Enquanto era madrugada no Brasil, esta terça-feira no Japão foi marcada por uma mudança no ambiente da 10ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica: na véspera do início das negociações de alto-nível entre ministros dos países – quando as decisões sobre a conservação da biodiversidade na próxima década serão tomadas –, alguns ministros e chefes de estado começaram a chegar em Nagoia e se preparam para a reta final da COP 10 da CDB.

O centro de convenções está com mais movimento: oito mil pessoas do mundo todo estão participando da conferência e aguardando definições das negociações. No entanto, o cenário ainda não é muito positivo.

Os grupos de trabalho que discutem os temas a serem acordados pelos ministros, tais como o protocolo de repartição de benefícios dos recursos genéticos da biodiversidade (ABS), o Plano Estratégico 2011-2020 para redução da perda de biodiversidade e a mobilização de mecanismos financeiros para ações de conservação, ainda enfrentam impasses.
Plano Estratégico

Em relação ao Plano Estratégico, documento que define as ações de conservação que serão implementadas pelas partes na próxima década, países continuam sem concordar sobre o percentual de área das ecorregiões do planeta a serem destinadas a áreas protegidas.  Enquanto a Rede WWF e o WWF-Brasil defendem 20% de proteção para áreas terrestres, marinhas e costeiras, a previsão é de um acordo animador na parte terrestre entre 15 a 25%, mas preocupante nas áreas marinhas e costeiras, com opções entre 6 e 15% . Alguns países, inclusive o Brasil, ainda têm resistido à proteção do alto mar, além das áreas sob jurisdição nacional.

“O Brasil defende a proteção de 20% em áreas terrestres e 10% em áreas marinhas”, afirmou Bráulio Dias, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente. Dias ainda apontou que em relação à missão do Plano Estratégico, o Brasil está defendendo a proposta de redução pela metade das taxas de desmatamento até 2020, apesar de estar disposto a negociar uma proposta de missão com redução próxima a zero em algumas áreas.

“Essa posição não é muito ambiciosa, e a Rede WWF e o WWF-Brasil defendem a redução a zero da taxa de perda de biodiversidade até 2020 e, por conseqüência, também da taxa de desmatamento. Esperamos que o Brasil seja de fato flexível e aceite pelo menos a assumir o compromisso de reduzir até próximo a zero, com possibilidade de avaliarmos mecanismos de compensação no futuro”, afirmou Cláudio Maretti, superintendente de conservação do WWF-Brasil.

Com relação ao debate sobre a conservação do alto mar, o Brasil tem praticamente sido o mais resistente em termos de aceitar indicações das áreas mais importantes para conservação. A argumentação é que não compete à CDB criar áreas protegidas, pois como são áreas além da jurisdição nacional, há necessidade de um mecanismo internacional de controle.

No entanto, para muitos outros países, e a própria Rede WWF, com responsabilidade de defender a biodiversidade na Terra, a CDB deve não só definir critérios, como buscar a definição de quais tipos de áreas são importantes de serem conservadas.

Repartição dos benefícios da biodiversidade

Sobre o protocolo de ABS, os avanços que vinham sendo relatados pelas delegações dos países nos últimos dias, sofreram retrocesso novamente e palavra por palavra está sendo negociada. Ainda pior que isso é que partes que já estavam negociadas estão sendo debatidas novamente e a União Européia tem sido um dos blocos mais resistentes.

Porém, ainda há esperanças. Independente dos debates nos grupos de trabalho, percebe-se uma grande movimentação dos ministros e outras autoridades para articulações bilaterais em busca de acordos.

Segundo a delegação brasileira, conversas paralelas com União Europeia têm indicado uma possibilidade de negociação. Nesse tema, como indicou o secretário Bráulio Dias, o Brasil faz questão que os derivados dos recursos genéticos da biodiversidade, que são os elementos produzidos a partir destes recursos, estejam definidos no escopo do protocolo, mas concordará em definir outros detalhes em reuniões futuras.

“Nós entendemos que ainda há muitos conflitos entre interesses que devem ser resolvidos, mas estou confiante que conseguiremos fechar esta COP com um bom resultado”, afirmou Dias.

 “Os próximos dias serão decisivos para o equilíbrio do planeta na próxima década e esperamos muita vontade política para resolver os impasses. O mundo espera grandes decisões desse encontro pelo fato de que esperar mais dez anos para definirmos ações efetivas pela biodiversidade será tarde demais”, ressaltou a secretária-geral do WWF-Brasil Denise Hamú.

Amazônia e ARPA em eventos paralelos na COP

Enquanto as negociações em torno dos objetivos da Convenção acontecem nos grupos de trabalho e plenária, diversos eventos paralelos são realizados nas salas do centro da convenção. Hoje, o Ministério do Meio Ambiente, o WWF-Brasil, o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e o governo do estado do Amazonas apresentaram em evento os resultados da primeira fase de implementação do Programa de Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA).

Um dos maiores programas de conservação da biodiversidade em florestas tropicais do mundo, o ARPA é resultado de uma parceria, que envolve, além do governo federal e de governos dos estados da Amazônia brasileira (Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins), o Funbio, o Banco de Desenvolvimento Alemão (KfW), a Agência de Cooperação Técnica Alemã, o Banco Mundial, o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) e o WWF-Brasil.

O Programa, criado a partir do desafio de proteger pelo menos 10% da biodiversidade amazônica, ainda no final da década de 1990, se iniciou com o objetivo de apoiar a criação, consolidação, e sustentabilidade financeira de unidades de conservação da Amazônia brasileira e obteve resultados significativos durante o período de 2003 a 2009 – a sua primeira fase.

44 novas unidades de conservação foram criadas na região e o programa apoiou a  consolidação de outras 18 áreas, num total de 62 UCs apoiadas, em um total de 32 milhões de hectares, conforme apresentação do diretor de áreas protegidas do Ministério do Meio Ambiente, Fábio França.

Durante o evento, o superintendente de conservação do WWF-Brasil apontou a importância do programa para o aumento do número de áreas protegidas na região, a melhoria da gestão dessas áreas, a proteção da biodiversidade e a redução do desmatamento, com conseqüente redução de emissões de gases do efeito estufa.

Segundo indicou Maretti, estudos orientados e apoiados pelo WWF-Brasil deixaram evidente que quanto mais longo é o período de apoio do Arpa às unidades de conservação - com fornecimento de recursos regularmente, equipamentos, treinamento de pessoal e acompanhamento e realização de estudos e análises técnicas - mais satisfatórios são os resultados de gestão e de conservação.

Em relação às mudanças climáticas, o Arpa contribuiu consideravelmente para a contenção das emissões de gases de efeito estufa, causadores do aquecimento global. As áreas protegidas na Amazônia brasileira, com sua expansão recente apoiada pelo Arpa, têm sido responsável por 37% da redução total do desmatamento obtida na região entre 2004 e 2006.

“As unidades de conservação não apenas conservam as áreas em seu interior, mas também contribuem para redução do desmatamento ao seu redor, criando uma barreira verde”, afirmou Maretti. Conforme a apresentação de Maretti, estudos indicam que as unidades de conservação apoiadas pelo Arpa são mais eficientes em conservar as florestas do que as que estão fora do programa: a grande maioria das unidades de conservação do Arpa (92%) conseguiu limitar a perda florestal a 5% ou menos da área.  No grupo fora do Arpa, somente 64% das unidades de conservação tiveram desmatamento igual ou menor do que 5%.

Nesse ano de 2010, teve início a segunda fase do Arpa, que tem como principal objetivo, além da criação de aproximadamente mais 30 milhões de hectares em áreas protegidas, a implementação dessas áreas.  “O desafio nesse segundo momento do programa é conseguir financiamento para investir na implementação dessas áreas, uma vez que essa implementação é fundamental para o cumprimento integral dos objetivos de conservação das áreas protegidas”, afirmou França, do MMA.

Para o representante do KfW presente no evento aparentemente esse não será um problema. “O Arpa é um modelo de conservação que deve ser replicado em outros países da Amazônia e em partes do mundo. Ver os resultados da primeira fase desse programa nos encoraja a continuar financiado a iniciativa, com claro compromisso para a fase 2, e mesmo para a fase 3 se o governo brasileiro desejar”, afirmou ao final do evento.
 

Durante toda a COP 10/CDB, a equipe do WWF-Brasil irá enviar, diretamente de Nagoia,  informações exclusivas, observações, curiosidades e fotos do evento, para o blog da campanha "Cuidar da natureza é cuidar da vida". Acompanhe!

 

A Rede WWF e o WWF-Brasil defendem a redução a zero da taxa de perda de biodiversidade até 2020 e, por conseqüência, também da taxa de desmatamento.
© WWF-Brasil / Marisete CATAPAN
Parceiros de diversas instituições apresentam resultados do programa Arpa.
Parceiros de diversas instituições apresentam resultados do programa Arpa.
© WWF-Brasil / Ligia Barros
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