Ameaçada, biodiversidade sustenta a economia na região dos Abrolhos

outubro, 09 2019

Análise do WWF-Brasil mostra que a biodiversidade rende mais em pescado e turismo do que a exploração de gás no campo de Manati
Por WWF-Brasil

O aumento da exploração de petróleo no litoral da Bahia, negociada pelo governo, põe em risco os blocos de corais e recifes de Royal-Charlotte e dos Abrolhos, reconhecidos pela riqueza da biodiversidade ímpar no Atlântico Sul. 

Estudo do WWF-Brasil trata da importância econômica da biodiversidade da região da Costa das Baleias e compara com os royalties que a indústria do petróleo paga ao município de Cairu, onde estão localizados os blocos da Bacia Sedimentar de Camamu-Almada oferecidos na 16ª Rodada de Licitações, marcada para esta quinta-feira. A oferta dos blocos, porém, está sob análise judicial.

O análise mostra que a biodiversidade também importa economicamente e rende mais em pescado e turismo do que a exploração de gás no campo de Manati.

De acordo com a análise, o município de Cairu deverá receber R$ 5,2 milhões em royalties pela exploração de gás em Manati em 2019, segundo previsão da Agência Nacional do Petróleo (ANP), o equivalente a 2,6% aos royalties pagos pela exploração de petróleo e gás na Bahia. Ainda segundo a previsão da agência, os pagamentos a Cairu cairão nos próximos anos até R$ 3,1 milhões, em 2023. As previsões não incluem a expansão da indústria de petróleo na região, que também vive do turismo.

“A região não é um vazio social e nem econômico. Milhares de famílias que vivem ao longo da Costa das Baleias tentando manter seus modos de vida tradicionais, tirando seu sustento do mar, dos mangues e estuários. Elas movimentam a economia local e asseguram a conservação das áreas”, lembra Jaime Gesisky, especialista em Políticas Públicas do WWF-Brasil, responsável por conduzir a análise.

Segundo ele, não só a biodiversidade, mas a vida desses brasileiros está em risco com a intenção do governo em leiloar quatro blocos para exploração de petróleo e gás próximo aos bancos de corais de Royal Charlotte e Abrolhos.

Economia local
De acordo com o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), a pesca nas regiões vizinhas aos Abrolhos movimenta R$ 100 milhões ao ano, valor que representaria 10% da receita com pesca no Brasil, além de garantir a subsistência de 20 mil pessoas.

Já o turismo representa 20% do Produto Interno Bruto dos municípios da Costa das Baleias, por meio não apenas das visitas ao parque, como pelo movimento em hotéis, pousadas e restaurantes da região. Só em 2018, o parque recebeu 6.403 visitantes, informou o instituto.

Daniel Siquara, secretário de Desenvolvimento Econômico e Pesca de Caravelas, acredita que, economicamente, o turismo seja mais importante do que a pesca na região dos Abrolhos, embora a ameaça ao berçário de peixes e da baleia jubarte seja mais assustadora. "Se acabar com Abrolhos, vai matar gente também".



Doutora em Oceonografia pela Universidade de São Paulo, com tese sobre Abrolhos, Marília Previero lembra nesta breve análise que o pescado capturado em Abrolhos é consumido em grandes cidades, como Vitória, Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo, sustentando uma cadeia de produção mais extensa, que seria afetada em caso de vazamento de óleo. 

Os recursos pesqueiros, segundo Previero, podem ser afetados de diversas formas, não somente pela contaminação de óleo diretamente, mas pela perda de habitat, por exemplo, decorrente da morte de corais, que são fonte de alimento e moradia para muitas espécies de peixes e lagostas importantes para a pesca. 

Medir os impactos de um vazamento de óleo sobre recursos pesqueiros de Abrolhos requer simulações com base em estudos sobre a mobilidade dos peixes, mapeamentos das áreas de ocorrência e desova das espécies, insiste a pesquisadora.  "São necessários estudos longos, profundos", sustenta Previero, que colaborou com o documento.

Apesar da complexidade do assunto, o governo insiste em liberar as áreas para o leilão. Dezessete empresas estão inscritas, a maioria de origem estrangeira. Os quatro blocos oferecidos na bacia de Camamu-Almada, no litoral da Bahia, são os que mais preocupam devido à proximidade com os bancos de corais de Royal-Charlotte e Abrolhos, considerados o segundo maior complexo de corais do mundo em importância em termos ambientais, o maior do Atlântico Sul.
 
“Em caso de acidente com derramamento de óleo, os impactos podem se estender do litoral norte da Bahia, área de elevada sensibilidade ambiental, até a costa do Espírito Santo, incluindo toda a Região dos Abrolhos, colocando em risco os corais, diversas espécies ameaçadas de extinção, além de toda a economia da pesca artesanal e o turismo na região”, diz Anna Carolina Lobo, gerente dos Programas Marinho e Mata Atlântica do WWF-Brasil

Segundo ela, além dos danos em Abrolhos de um eventual vazamento de óleo, reconhecidos pelo governo, plataformas de petróleo foram identificadas como vetores de espécies invasoras de corais, espalhadas em grande extensão da costa brasileira.

Pesca nas regiões vizinhas aos Abrolhos movimenta R$ 100 milhões ao ano
© Marco Antônio Teixeira/WWF-Brasil
Royal-Charlotte e Abrolhos são os maiores complexos de corais do Atlântico Sul
© Shutterstock
Arquipélago de Abrolhos é a principal área de reprodução de baleias-jubarte
© Marco Antônio Teixeira/WWF-Brasil
Aves do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, sul do litoral da Bahia
© Marco Antônio Teixeira/WWF-Brasil
Vista aérea de Abrolhos, Bahia
© Shutterstock
A extensão da mancha de óleo, em caso de vazamento, e os novos poços
© Ilustração
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