Em Santa Catarina, Seu Oswaldo sonha em desenvolver sua região com o beneficiamento da erva-mate

novembro, 17 2011

Há cinco anos o produtor começou a recuperação de parte das terras degradadas em sua propriedade por meio da conversão em sistemas agroflorestais
Por Sandra Damiani
Especial para o WWF-Brasil


Tradicional produtor de fumo, seu Oswaldo Havrelhuk, 49, é um exemplo da pequena propriedade catarinense e da transição entre dois modelos de produção agrícola. Nas três décadas em que trabalha no seu pequeno pedaço de chão – 9 hectares fincados em Santa Terezinha, na região central de Santa Catarina –, o descendente de ucranianos  viu os oito filhos crescerem, mas a floresta definhar e com ela os recursos que poderiam garantir seu modo de vida. 

Nos últimos anos, seu Osvaldo, esposa e filhos trabalham com afinco para trazer a mata de volta. A área, que já foi toda convertida em plantio convencional, agora exibe 2 hectares de floresta ao mesmo tempo em que cresce o ânimo da família para o consórcio entre espécies, como a araucária, o palmito e a erva-mate, todas originárias da Mata Atlântica. 

A área de plantio convencional já convertida para agrofloresta demonstra o que seu Oswaldo pretende fazer no restante de sua propriedade.  Metade dela estava degradada a tal ponto que não havia nem mesmo pasto. Hoje ele tem gosto em caminhar pela área convertida em agrofloresta e mostrar aos visitantes as palmeiras, juçaras, perobas, araticuns, canelas, imbuias, sassafrás e araucárias. 

O produtor vê no consórcio entre espécies da mata e na diversificação o futuro econômico ambientalmente sustentável para sua propriedade.  Só de jabuticaba são mil pés, com os quais pretende produzir geléia que, levando em consideração os dotes culinários da esposa, dona Cecília, será sucesso em vendas.
Faz cinco anos que seu Oswaldo começou a recuperação de parte das terras degradadas em sua propriedade por meio da conversão em sistemas agroflorestais. O impulso veio por acaso: uma carona com a equipe da Apremavi,  ONG  que desenvolve projetos para auxiliar o planejamento sustentável de imóveis rurais e a conservação da Mata Atlântica por meio da doação de mudas. Do encontro, resultou a parceria ideal para dar força a restauração e enriquecimento em suas terras.

Incluído em projeto de neutralização de carbono, ele já plantou 3 mil mudas entre nativas diversas, 2 mil somente de palmiteiro, como chamam por lá a palmeira juçara. Outra parte da área era um antigo roçado de milho que foi abandonado e depois de muitos anos com a ajuda de seu Oswaldo a floresta já se restabeleceu. É lá que seu Oswaldo planeja fazer sua Reserva Legal.

“Já está demorando”, afirma, referindo-se a intenção de ter a propriedade regularizada. O serviço de averbação gratuita, em andamento no Alto Vale do Itajaí, ainda não está disponível para ele no município de Santa Terezinha devido à espera pelas imagens de satélite que serão fornecidas pelo Ministério do Meio Ambiente.

A intenção do produtor é transformar toda a propriedade num sistema agroflorestal em que possa produzir erva-mate e diversos outros cultivos, como castanhas, café e frutíferas. Isso inclui até mesmo enriquecer as áreas de APPs com espécies nativas com os quais possa ter algum ganho econômico futuro. Na vanguarda de sua região, seu Oswaldo sabe que está em um momento de transição e investimentos, mas mostra-se animado como nunca. 

Produção e conservação

A exploração econômica em APPs é possível para fins de recuperação de áreas degradadas em pequenas propriedades rurais. No caso da RL é possível fazer a exploração econômica desde que se tenha um plano de manejo aprovado pelo órgão ambiental.

“A Reserva Legal e as APPs não atrapalham as atividades econômicas das propriedades, pelo contrário, se bem utilizadas podem contribuir na geração da renda da família, que em contrapartida ainda terão os benefícios ambientais”, ressalta o assessor florestal da Apremavi, Leandro Casanova, que acompanha o desenvolvimento da agrofloresta.

Alternativa para o desenvolvimento local

Há 12 anos, seu Oswaldo começou a plantar os primeiros pés de erva-mate e pôde constatar o ganho que a floresta poderia trazer. Na última colheita, foram 5 toneladas da planta. “A erva dá 80% de lucro. É só plantar”, calcula o produtor, referindo-se ao fato de que em meio a outras espécies nativas ela se desenvolve sem aplicações de agrotóxicos.  Ainda oferece um trabalho em ambiente sombreado e muito menos extenuante do que o plantio de fumo. Para o próximo ano, parte dos três hectares usados para o plantio de fumo já estão na mira de seu Oswaldo para ampliar o sistema agroflorestal.

Todavia, a mudança não foi só na propriedade. Junto com o amigo Mario Latauczeski, morador da comunidade vizinha de Rio da Anta, que recuperou uma área de 7 hectares de pastagem degradada e também cultiva erva-mate, ele tem estimulado outros agricultores ao plantio de espécies nativas. “Meu sonho é beneficiar o produto aqui. Hoje minha erva foi parar no Rio Grande do Sul”, diz, sonhando com o que pode ser uma alternativa de desenvolvimento sustentável para região. “Assim poderíamos aumentar os ganhos e haveria menos perdas na colheita”, completa.

Atualmente, as folhas são vendidas por quilo, in natura, com valor muito inferior ao que poderia ser obtido caso o produto tivesse processamento local. Mas para a compra do maquinário usado para processar a erva, seu Oswaldo esbarra na falta de recursos e linhas de financiamento que pudessem dar o impulso para produtores que, como ele, querem aumentar a produção em harmonia com a floresta. “Vem recursos, mas só para plantar fumo”, constata o produtor que atualmente procura alternativas para a compra do equipamento.

Recentemente ele e outras 14 famílias participaram de curso do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) onde seu Oswaldo apresentou a produção de erva-mate consorciada com árvores nativas como proposta para o desenvolvimento local. “Eles deram nota 10 à minha idéia”, afirma com certo orgulho. Atualmente, o Brasil é o maior exportador mundial do produto e segundo estudos da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos há potencial para ampliar o mercado internacional.  Ele lamenta, entretanto, a falta de mecanismos que pudessem estimular esse tipo de produção. “Já era para estar tudo em erva-mate, mas não temos tido apoio”, justifica. Boa parte das mudas de erva-mate é produzida em viveiro próprio com a ajuda do filho.

“Temos que achar uma saída. A depreciação da propriedade é muito grande. Só vamos usando, destruindo a terra, a madeira”, conclui, descrevendo um modelo que não segue mais, mas ainda é amplamente adotado na região. Além disso, com baixa rentabilidade e sem orientação muitos produtores continuam usando madeira nativa para a secagem do fumo.  “O modelo atual tem 110 anos na região e só tem trazido prejuízos”, avalia.

Não é à toa a alegria do produtor ao ver os animais silvestres retornando, a terra tornando-se mais fértil e pródiga em biodiversidade e sua propriedade sendo novamente recoberta pela proteção da mata. As propriedades de seu Oswaldo e do amigo Mário, dois novos pontos verdes em Santa Terezinha, seguem um novo caminho em que a Mata Atlântica é parceira quando está em pé e a prosperidade rima com qualidade de vida.

A pequena propriedade de seu Oswaldo Havrelhuk, 49, é um exemplo da transição entre dois modelos de produção agrícola
© WWF-Brasil/ Vanessa Sousa
Área em restauração para Reserva Legal
© WWF-Brasil/Sandra Damiani
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