"Precisamos falar sobre oceanos com mais frequência", diz presidente do WWF Internacional
setembro, 08 2017
Nesta entrevista, Yolanda Kakabadse comenta o 4o Congresso Internacional de Áreas Protegidas Marinhas, que terminou nesta sexta-feira, no Chile.
Por Jaime Gesisky/La Serena-Coquimbo (Chile)Durante uma semana, cientistas, ONGs, comunidades e governos de oitenta países se reuniram para o 4o Congresso Internacional sobre Áreas Protegidas Marinhas, em La Serena-Coquimbo, no litoral do Chile.
Organizado pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), o evento terminou nesta sexta-feira (8) depois de cumprir uma extensa agenda de debates sobre a importância de se proteger oceanos e mares.
O congresso – um dos mais importantes para a comunidade científica internacional – acontece a cada quatro anos. Isso explica em parte certa ansiedade no ar e o volume absurdo de informações nos plenários e eventos paralelos do encontro.
Mas chegou-se a um ponto em que não dá para esperar mais quatro anos até um novo debate como esse. As alterações nos mares e oceanos do planeta estão se dando de modo muito veloz.
“A emergência da questão que envolve mares e oceanos é tamanha que será preciso tornar esses encontros mais frequentes, regionalizados e com participação cada vez maior da sociedade”, disse ao final evento a presidente do WWF Internacional, Yolanda Kakabadse. Para ela, a conservação marinha deve ser a nova agenda mundial.
Por que que devemos tornar a discussão sobre conservação marinha mais frequente?
Quatro anos de intervalo entre um congresso e outro é muito tempo. Muitas coisas se passam com os oceanos nesse meio tempo, principalmente coisas ruins. A informação que temos agora, em 2017, comparada à que tínhamos em 2013 em relação à contaminação dos oceanos, à destruição dos recursos marinhos, ao desaparecimento dos recifes de corais é muito maior. Tudo se dá de modo acelerado. Temos de ser mais rápidos em entender coletivamente o problema apontar saídas.
Qual é a proposta?
Fazer reuniões intermediárias como essa sobre áreas marinhas entre as regiões e entre os continentes e buscar formas mais ativas de trabalhar entre os países. Equador, Peru, Costa Rica, por exemplo, compartilham muitíssimo o ecossistema do Pacífico. Precisam discutir como abordar isso regionalmente. Outros países não compartilham o mesmo ambiente, mas têm responsabilidades comuns sobre algumas espécies que migram de uma região para outra. Esses países devem trabalhar muito mais intensamente, e de modo muito mais frequente, ao invés de esperar por um congresso para encaminhar as questões científicas, sociais e políticas que surgem desse debate.
E o que se observou ao longo dos últimos quatro anos?
Que estamos fazendo muito mais pesquisas. Os dados aumentaram. Por um lado, isso é bom. Mas por outro, os cientistas nos informam que há ainda mais razões para estarmos preocupados.
Com o quê, exatamente?
A questão da poluição pelo plástico é urgente. O plástico se dissolve em fibras microscópicas que acabam sendo consumidas pelos peixes e ficam em seu organismo. E aí, nós comemos esse peixe. Estudos mostram que o plástico causa degeneração e anomalias na reprodução e no crescimento das espécies. E isso está sendo transferido para o consumidor final que compra esse peixe no mercado.
E a questão climática?
Estamos tendo crise no tamanho e na quantidade dos peixes. As águas marinhas estão se aquecendo e se acidificando fazendo com que metade dos recifes de coral já tenha desaparecido. E o restante dos corais pode desaparecer nos próximos trinta anos. É uma brutalidade! Considerando que que os oceanos são ecossistemas que mais absorvem carbono, se não agirmos imediatamente para manter a vida nos mares, um triste futuro nos espera.
O que mais preocupa os cientistas?
A aquicultura, por exemplo. Embora essa atividade seja uma boa resposta para a demanda de alimentos, e que provavelmente proteja as espécies marinhas que estão livres, não fizemos uma boa aquicultura em termos mundiais. Destruímos manguezais e fiords para introduzir fazendas de cultivo de peixes. Adotamos o caminho de produzir em larga escala com base no uso de antibióticos. Uma irracionalidade total. Nós temos de rediscutir isso, pois os impactos na vida marinha são enormes.
A gestão participativa envolvendo comunidades tradicionais parece também ser uma nova questão que emerge nesse debate.
Este é um segundo resultado fabuloso deste congresso: reconhecer que as comunidades locais que vivem no mar e do mar são atores importantíssimos nos processos de discussão de como proteger o ambiente marinho. Sem as comunidades, as áreas marinhas e costeiras não têm futuro. Elas são as melhores guardiãs dos recursos marinhos. E além disso, têm tradições seculares de como proteger esses recursos. Por isso, devemos incorporar com muito mais força as comunidades locais ao redor de todo o mundo no destino das áreas protegidas. Proteger mais não significa necessariamente proibir o acesso. É ter racionalidade para acessar. E isso essas populações têm.
E como falar de mar para as pessoas comuns, que não sabem sobre esse tema, mas que precisam se envolver na proteção marinha?
Todo mundo consome pescados. E como consumidores, podemos chegar com a informação que diga de onde vem esse pescado, como vem e por que é importante saber disso. O pescado é fundamental para a alimentação humana. Então, vincular o que você come com a origem dessa comida é mais fácil. Comer é um ato diário. Todo ser humano é um especialista em alimentos. Sabe do que gosta, do que não gosta, onde encontra, onde compra, quanto custa. Está muito perto do ser humano. E poder educar através da comida não é tão difícil como educar sobre o metal que está em um automóvel.
E qual é o fio de esperança de que isso pode dar certo?
O fio de esperança é o ser humano. Quando entende o problema, ele parte em busca de solução. O que temos de fazer é falar ao cidadão de modo simples para que entenda o problema e se torne em um aliado.