BR-319: Lideranças indígenas têm o direito e precisam ser ouvidas na discussão sobre a rodovia

junho, 30 2020

Oficinas realizadas no interior do Amazonas ajudaram na construção de protocolos de consulta
WWF-Brasil vem trabalhando para fazer o valer a Convenção 169 da OIT - que prevê a consulta livre, prévia e informada dos povos impactados por projetos de infraestrutura

Por Jorge Eduardo Dantas


A discussão em torno da rodovia BR-319 está entre as mais controversas da Amazônia. Inaugurada em 1976 e abandonada em 1988 devido à falta de manutenção, a pavimentação total desta rodovia, que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO), é motivo de polêmica.

De um lado, grupos alegam que a estrada é fundamental para garantir a circulação de pessoas e mercadorias e impulsionar o “desenvolvimento”, principalmente no Sul do Amazonas; de outro, pessoas e organizações chamando a atenção para os prejuízos socioambientais que ela traria, como aumento dos índices de desmatamento e perda de biodiversidade.   

A BR-319 possui 885 quilômetros quadrados e, desde sua criação, entre reformas e estudos, já foram investidos mais de U$ 150 milhões.

No centro dessa discussão, estão as populações indígenas. Ao menos 63 Terras Indígenas podem ser impactadas caso a estrada seja pavimentada sem uma governança adequada -com controle de tráfego e fiscalização permanente, que impeça violência contra povos indígenas e comunidades tradicionais, roubo de madeira, invasões e grilagem. 

Para evitar esses problemas, o WWF-Brasil e vários parceiros tem apoiado a construção de protocolos de consulta, documentos que apresentam, formalmente, de que maneira os diferentes povos indígenas daquela região devem ser ouvidos na discussão de obras de infraestrutura que impactem suas vidas e territórios.

 

Mais de 145 lideranças, representando diversos povos -Wajãpi, Mura, Apurinã, Sateré, Tenharim, Jiahui, Suruí, Munduruku, Kaiabi, Paumari e Deni– participaram de duas oficinas, realizadas nas cidades de Manaus e Tapauá, que discutiram o que são protocolos de consulta e a importância deste instrumento para o fortalecimento das organizações indígenas.

Fazem parte desta mobilização o Cimi (Conselho Indigenista Missionário), o Idesam (Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia), o IEB (Instituto Internacional de Educação do Brasil) e o MPF-AM (Ministério Público Federal do Amazonas)

A estudante Walela, do Povo Suruí, falou sobre a importância das oficinas: “O indígena é invisibilizado. O governo não sabe o que é o indígena, não se preocupa com o indígena e não tem sequer o cuidado de perguntar. Então por isso este espaço é importante, para nos inserimos nessas discussões e dizer, 'Ei, isso é meu direito'”. 

O analista de Políticas Públicas do WWF-Brasil Bruno Taitson resumiu a discussão que foi feita nessas oficinas: “Os protocolos de consulta são regras, é o povo indígena dizendo: é desta maneira, desta forma que queremos ser ouvidos”, explicou.

O WWF-Brasil entende que as associações locais, comunidades e lideranças indígenas e extrativistas do Sul do Amazonas devem ter voz ativa durante o processo de discussão das obras de asfaltamento da BR-319.

Assim, que se faça cumprir a Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), da qual o Brasil é signatário, e que assegura o direito à consulta livre, prévia e informada dos povos impactados por projetos de infraestrutura públicos e privados.

“A Convenção 169 traz algumas garantias básicas, como o direito à consulta livre, prévia e informada, culturalmente adequada... É uma consulta que o governo brasileiro não faz”, disse o representante do MPF, o Procurador da República Fernando Merloto.

A criação e manutenção de Terras Indígenas são um dos instrumentos mais poderosos de conservação do Meio Ambiente -nos últimos 40 anos, apenas 2% das Terras Indígenas perderam suas florestas originais. Esses territórios mantêm os estoques de recursos naturais, promovem serviços ecossistêmicos e ajudam na regulação climática do planeta.
Mais de 145 lideranças, representando diversos povos - Wajãpi, Mura, Apurinã, Sateré, Tenharim, Jiahui, Suruí, Munduruku, Kaiabi, Paumari e Dení - participaram das oficinas promovidas pelo WWF-Brasil e seus parceiros
Mais de 145 lideranças, representando diversos povos - Wajãpi, Mura, Apurinã, Sateré, Tenharim, Jiahui, Suruí, Munduruku, Kaiabi, Paumari e Dení - participaram das oficinas promovidas pelo WWF-Brasil e seus parceiros
© Samara Souza/ WWF-Brasil
Especialistas apontam que 63 povos e cerca de 18 mil indivíduos indígenas serão impactados pelas obras da BR-319
Especialistas apontam que 63 povos e cerca de 18 mil indivíduos indígenas serão impactados pelas obras da BR-319
© Samara Souza/ WWF-Brasil
Inaugurada em 1976 e abandonada em 1988, a pavimentação total da BR-319 é motivo de muitos debates
Inaugurada em 1976 e abandonada em 1988, a pavimentação total da BR-319 é motivo de muitos debates
© Drance Jésuz/WWF-Brasil
As Terras Indígenas exercem uma importante função na defesa do Meio Ambiente - nos últimos 40 anos, apenas 2% de suas florestas originais foram devastadas
As Terras Indígenas exercem uma importante função na defesa do Meio Ambiente - nos últimos 40 anos, apenas 2% de suas florestas originais foram devastadas
© Samara Souza/ WWF-Brasil
A BR-319 é uma rodovia com pouca estrutura e manutenção precária, que oferece muitos desafios aos motoristas que trafegam por ela
A BR-319 é uma rodovia com pouca estrutura e manutenção precária, que oferece muitos desafios aos motoristas que trafegam por ela
© Drance Jésuz/WWF-Brasil
As oficinas promovidas pelo WWF-Brasil e parceiros reuniram lideranças de toda a região Sul do Amazonas
As oficinas promovidas pelo WWF-Brasil e parceiros reuniram lideranças de toda a região Sul do Amazonas
© Samara Souza/ WWF-Brasil
Na Amazônia, as estradas geralmente são vetores de desmatamento e degradação, causando sérios impactos no interior da floresta
Na Amazônia, as estradas geralmente são vetores de desmatamento e degradação, causando sérios impactos no interior da floresta
© Drance Jésuz/WWF-Brasil
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