Católicos brasileiros avaliam negativamente atuação de Bolsonaro com relação à Amazônia
08 outubro 2019
Pesquisa mostra também que apenas 3 em cada 10 católicos entendem como positiva a atuação do Presidente Jair Bolsonaro na área ambiental
Sete em cada dez católicos consideram muito importante preservar a Amazônia porque o crescimento do país e o desenvolvimento nacional dependem do meio ambiente protegido. Para 85% deles, atacar a Amazônia é também uma questão moral: um pecado. Estas são algumas das conclusões da pesquisa Católicos e Amazônia, conduzida pelo instituto Ideia Big Data a pedido da Purpose.Divulgada às vésperas do Sínodo da Amazônia e pouco depois de um contundente discurso do presidente Bolsonaro na ONU, a pesquisa Católicos e Amazônia ouviu 1.502 católicos, homens e mulheres, maiores de 16 anos, em todo o Brasil, de 01 a 13 de junho de 2019. O resultado mostra baixíssimo apoio às políticas ambientais do governo federal por parte do público católico, que corresponde a 64% dos brasileiros, segundo o último censo do IBGE. Veja os destaques da pesquisa no final do texto.
Para comentar os resultados do levantamento, a Purpose, com o apoio de iCS, WWF-Brasil, Gota no Oceano, ISER, ClimaInfo e GCCM, reuniu especialistas para debater o resultado da publicação e possíveis caminhos a partir de agora. Os responsáveis pela pesquisa comentaram que as entrevistas foram conduzidas antes das notícias sobre o aumento dos focos de queimada na Amazônia. De acordo com eles, se a coleta tivesse sido feita durante a divulgação das queimadas, os dados seriam ainda mais dramáticos.
A professora Isabela Kalil, do núcleo de Sociologia Urbana da FESPSP, trouxe a análise comportamental da pesquisa, ressaltando que, de acordo com as respostas, estamos vivendo em um impasse: “as pessoas estão conscientes que a questão ambiental é importante, mas não sabem o que fazer. Poucas respostas se materializam em ações concretas”, diz.
Frei José Francisco, da Sinfrajupe (Serviço Inter-Franciscano de Justiça, Paz e Ecologia) ressaltou a importância do momento que a Igreja Católica vive, uma mudança histórica em que o Papa Francisco coloca a criação como centro. “A partir dessa visão, o homem é um dos destinatários do evangelho [e não o único]. O Sínodo é uma expressão desse jeito novo de pensar e de ser, em que temos que olhar o todo, ver que somos interdependentes e que não há como pensar o homem de forma isolada”. O frei ressaltou também que essa mudança mexe com uma reestruturação da relação de poder. “O Papa Francisco trabalha a desverticalização da Igreja. Isso talvez explique as violentas reações em relação ao Sínodo”.
Sônia Gomes de Oliveira, presidente do CNLB (Conselho Nacional do Laicato no Brasil) comentou que o modelo econômico que estão querendo implantar na Amazônia é o mesmo que já foi feito no norte de Minas (citando os problemas das mineradoras) e que, em nome de um falso desenvolvimento econômico, traz a destruição do que temos de melhor.
“Nós precisamos de uma Igreja comprometida com a vida, com a justiça, com a transformação da sociedade. É um desafio para nós, cristãos laicos, entender como podemos atuar diretamente, não ficar só no falatório. Enquanto o laicato não assumir na prática aquilo que o Papa Francisco faz, nós vamos continuar degradando o meio ambiente”, fala Sônia.
Benedito de Queiroz Alcântara, presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica/REPAM, ressaltou o fato de que não existe uma crise apenas da economia: “é uma crise ambiental, mas também social, uma crise da humanidade, do planeta como um todo, da casa comum. Para isso, devemos aprender com os povos indígenas, comunidades originais, que conseguiram conviver com essa biodiversidade. Eles souberam e sabem cuidar dessas cuencas sagradas, das florestas. Francisco nos chama para uma igreja de escuta, juntos, e não mais hierárquica.
O jornalista do Estado de São Paulo, José Maria Mayrink, que há anos faz a cobertura católica, relembrou do grande destaque que o Sínodo está recebendo pela imprensa, como uma reação aos ataques do presidente brasileiro ao encontro.
Por fim, a diretora de engajamento do WWF-Brasil, Gabriela Yamaguchi, reforçou que, neste momento de mudanças que estamos vivendo, cada um de nós é essencial. Quando isso é colocado em frente da ciência, a pergunta que precisamos fazer é: qual a educação ou que tipo de desenvolvimento precisamos.
“Na dúvida do que podemos fazer, vamos escutar os povos amazônicos. É importante haver uma rede de comunicação onde a formação venha do território. Nós, de ONGs, temos recebendo muitos ataques. Então, vamos ouvir o que as pessoas que lidam ou trabalham com essas ONGs ouvir o que elas têm a dizer e ver onde podemos melhorar. Governo não é um grande irmão, governo deve nos representar. A gente precisa buscar a voz das pessoas e não deixar ninguém para trás”, completou a diretora, enfatizando a necessidade de trabalharmos a adaptação às mudanças climáticas, que afetam principalmente a população mais pobre.
Resultados da pesquisa:
Opinião geral
- Mais da metade dos católicos (52%) considera o desmatamento florestal como a maior ameaça à natureza atualmente. Em segundo lugar aparece a poluição das águas, rios e mares, com apenas 19%.
- Para 85% dos católicos, a Amazônia é fundamental para reduzir os efeitos do aquecimento global, o que demonstra que a maioria deles relaciona a preservação da floresta com o combate aos efeitos das mudanças climáticas.
- 83% dos entrevistados reconhecem que o aquecimento global é uma realidade já comprovada por cientistas.
- Quase um terço (29%) avalia a atuação do Presidente Jair Bolsonaro na área ambiental como péssimo e 12% como ruim. Isso totaliza 41% da população católica desaprovando a atuação do governo nessa área. Ao mesmo tempo, 30% dos entrevistados avaliam como sendo regular, e 22% como ótima ou boa. Ou seja, apenas 2 em cada 10 católicos avaliam a atuação do Presidente como positiva na área ambiental.
- Três em cada quatro católicos são contra acabar com as multas ambientais de quem causa desmatamento ilegal e 73% discordam do enfraquecimento da capacidade de fiscalização do IBAMA com relação ao desmatamento florestal.
- Sete em cada 10 católicos são contra a redução de reservas indígenas ou de comunidades quilombolas e percentual semelhante (68%) discorda da extinção de reservas legais de proteção ambiental. 70% são contra o fim do Fundo Amazônia e 63% não concordam com a negação dos dados históricos e atuais do INPE sobre desmatamento florestal.
- Com relação à confiança em pessoas e instituições quando falam sobre a Amazônia, 9 em cada 10 católicos (87%) dizem confiar no Papa Francisco e 86% confiam na Igreja Católica enquanto instituição. Outros 79% dizem confiar na família e nos amigos, 71% na ONU, 67% nas ONGs e 60% na imprensa.
- A instituição com menor confiança dos católicos quando o assunto é Amazônia é o governo brasileiro, com 49% de confiança, sendo que 44% dos entrevistados dizem não confiar no governo quando fala, comenta ou divulga dados em relação à floresta Amazônica.