Segue indefinida ampliação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros
dezembro, 05 2016
Proposta de ampliação tem de fazer sentido para a conservação da biodiversidade
por Jaime GesiskyO Ministério do Meio Ambiente recebeu do governo de Goiás na semana passada uma contraproposta ao projeto de ampliação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros.
Antes de enviar a proposta, porém, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Secima) publicou uma nota no site com o desenho pretendido pelo estado.
Segundo a nota, o governador Marconi Perillo havia dado o aval para a ampliação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros em 90 mil hectares.
Foi uma surpresa para os que acompanham as discussões sobre a ampliação do parque.
É que no último dia 11 de novembro, durante reunião com o secretário de Biodiversidade e Florestas do MMA, José Pedro de Oliveira Costa, e representantes do governo goiano chegou-se ao entendimento de se ampliar a área do parque dos atuais 65 mil hectares para 222 mil hectares, em uma faixa contínua em direção ao município de Nova Roma. A reunião foi documentada em ata.
O acordo previa ainda tratamento especial a duas áreas adjacentes, mais ao sudeste, que ficaram sob uma espécie de quarentena para que os proprietários tivessem tempo de transformá-las em reservas particulares.
Esse desenho favoreceria a conservação de atrativos naturais e, pelo menos, uma espécie ameaçada de extinção, o pato-mergulhão. Também garantiria a sobrevivência de centenas de nascentes.
Mas o governo estadual recuou, e levou em conta em sua proposta apenas questões fundiárias, que estariam pendentes. Com isso, a área do parque aumentaria em somente mais 90 mil hectares.
De acordo com a Secima, o novo desenho do parque incluiria “as áreas cujas matrículas foram validadas pelas ações discriminatórias já concluídas”. Noventa propriedades rurais ainda precisam ser tituladas, segundo o governo.
O Ministério do Meio Ambiente, que por duas vezes havia concedido prazo a Goiás para encontrar soluções para o imbróglio fundiário, ainda não se manifestou sobre a nova proposta.
Apelo científico
Para a Coalizão Pró-UCs – entidade que reúne nove das principais organizações ambientalistas que trabalham com áreas protegidas no Brasil, qualquer proposta que venha a ser colocada na mesa precisa ser discutida do ponto de vista técnico e científico da conservação. E não levar em conta apenas critérios fundiários.
O grupo espera colaborar para que o governo do estado e a União cheguem a uma solução negociada.
Na opinião dos especialistas, a atual proposta da Secima não garante a conservação da vegetação nativa, compromete importantes mananciais hídricos e impede o livre fluxo de biodiversidade.
De volta ao começo
A proposta original de ampliação do parque de Veadeiros feita pelo MMA teve como base audiências públicas previstas em lei e estudos técnicos e científicos que priorizaram áreas de grande relevância para conservar espécies ameaçadas de extinção, como o lobo-guará, o pato-mergulhão, a raposinha do cerrado, o morcego beija-flor.
A área de ampliação defendida pela União é formada por diferentes ecossistemas do cerrado de altitude, com espécies raras e que existem somente naquela região.
“Proteger esse ambiente natural será um dos maiores legados do governo de Goiás para o Brasil”, ressaltou Mariana Napolitano, coordenadora do Programa de Ciências do WWF-Brasil e membro da Coalizão.
A Coalizão Pró-Ucs espera que o debate seja reaberto de forma clara e transparente, e que o governador Marconi Perillo ouça os argumentos da comunidade científica, antes de se pronunciar pela proposta.
Uma campanha promovida pela Coalizão Pró-Ucs apela por uma área de 222 mil hectares para o parque de Veadeiros, de forma contínua, que garanta a sobrevivência das espécies e a integridade da paisagem: #ampliaveadeiros
Visibilidade internacional
A Chapada dos Veadeiros atrai milhares de turistas de todo o mundo que vão em busca da experiência da natureza. De janeiro a novembro deste ano, a unidade recebeu cerca de 60 mil visitantes.
Segundo estimativas, esse fluxo movimentou cerca de R$ 70 milhões na economia dos municípios do entorno do parque.
De acordo com o chefe do parque nacional, Fernando Tatagiba, do Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade (ICMBio) estão em jogo a conservação de espécies únicas do bioma Cerrado, a segurança hídrica da região – incluindo para o agronegócio – e o direito das gerações futuras de usufruir de tudo isso.
“Trata-se de um valor para a humanidade”, destacou Tatagiba.
Pesquisa
O Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros tem como uma de suas funções primordiais possibilitar o avanço da ciência.
Todos os anos, a unidade de conservação gera um volume considerável de pesquisas científicas.
De 2008 a 2016 foram submetidos 467 projetos de pesquisa procedentes de 38 Instituições de pesquisa e ensino do Brasil e do exterior.
A maior parte dos projetos de pesquisa refere-se à flora do Cerrado, rica em informações que podem render para o país conhecimentos para diversos ramos da bioindústria, por exemplo. Mas não só.
Os estudos também trazem luz a áreas como ecologia, conservação, turismo, manejo do fogo, química, turismo e ciências sociais.
O aumento da área protegida do parque nacional, como pretendem os cientistas, ampliará também a conservação de espécies ameaçadas e de grandes mamíferos – que necessitam de áreas maiores para a sua manutenção.
Conservará campos de altitude e de outras fisionomias hoje não contempladas na atual área, sobretudo formações florestais e manchas de mata seca – um ecossistema à beira do desparecimento.
Além desta, outras oito fisionomias do bioma Cerrado deverão ser protegidas. São elas: as matas de galeria, cerradão, cerrado sentido restrito, parque cerrado, vereda, campo sujo, campo limpo e campo rupestre.
Nestes ecossistemas foram identificadas 17 espécies da flora e 32 espécies da fauna ameaçadas de extinção, todas na lista oficial de espécies ameaçadas do Brasil.
A conservação dos recursos hídricos e seus serviços ambientais e a proteção de áreas de elevada beleza cênica pretendidas vão influir no aumento do uso público e do turismo em toda a região.
O país só tem a ganhar com a ampliação de uma grande área contínua de Cerrado na Chapada dos Veadeiros.