Entrevista: Thomas Lovejoy

junho, 08 2012

 Thomas Lovejoy, professor titular de Ciência e Política Ambiental da Universidade George Mason, e presidente de biodiversidade do Centro Heinz para Ciência, Economia e Meio Ambiente.
 O ambientalista americano Thomas Lovejoy, professor titular de Ciência e Política Ambiental da Universidade George Mason, e presidente de biodiversidade do Centro Heinz para Ciência, Economia e Meio Ambiente, estuda a Amazônia há mais de 40 anos.

Lovejoy esteve a primeira vez na Amazônia em 1965. A experiência de anos acumulados com o estudo do bioma levou-o a desenvolver ideias como a de permitir que países em desenvolvimento mantenham atividades de conservação em troca da redução de suas dívidas externas.

Ele é entusiasta do sistema de pagamento por serviços ambientais e mecanismos de compensação de carbono, como as Reduções de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD) e mostra preocupação com a destruição dos biomas: o atingimento da marca de um quinto de desmatamento da Amazônia poderá ser irreversível.

No Brasil, Lovejoy faz parte do Conselho Curador da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (Rio de Janeiro), e já foi condecorado com a Ordem do Rio Branco (1988), a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico (1998), e a medalha João Pedro Cardoso, concedida pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, em 2011. A seguir a entrevista que concedeu por escrito ao WWF.

O que fazia à época da Rio 92? Recorda-se de algum episódio que marcou a conferência?
Eu participei como membro da delegação dos EUA e havia sido integrante do grupo que Tolba convidara a Nairobi para discutir o que uma convenção sobre diversidade biológica deveria tratar, e também fui participante ativo no Fórum. O aspecto negativo que me lembro foi o vazamento do memorando de Bill Reilly, em Washington, que resultou na não-assinatura da Convenção sobre Biodiversidade pelos EUA. Também fiquei impressionado com o empenho do Brasil em fazer acontecer coisas importantes. A maioria dos países industrializados deu importantes contribuições.

Quais países tiveram participação mais destacada na Rio 92? Como foi a participação dos latino-americanos?
Acho que os países mais sofisticados estavam seriamente empenhados em alcançar progressos substanciais nas questões em pauta. E havia um consenso geral sobre quais eram os desafios ambientais.

Quais os principais legados da conferência Rio 92?
As duas convenções, a Agenda 21 e Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) foram um legado impressionante. As decepções foram a pequena escala de assistência prestada em comparação aos montantes previstos, e o fracasso geral da UNFCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima) para fazer grandes progressos na redução das emissões de combustíveis fósseis e em relação às REDD e REDD +.

Entre as resoluções da Rio 92, alguma área não avançou?
Em termos de mudanças climáticas não houve avanços porque se parou na questão "quem vai primeiro", quando na verdade não há tempo a perder com frivolidades. Com relação à biodiversidade, fez-se tanto barulho em torno do acesso e partilha de benefícios que o progresso de conservação foi colocado em segundo lugar. As crescentes taxas de extinção (vide o Terceiro Panorama Global de Biodiversidade, da ONU) são, em grande parte, consequência de um pontapé inicial lento.

Qual deveria ser o principal resultado da Rio+20?
Metas energéticas ambiciosas, mas exequíveis. Uma forma clara de se abordar a economia verde de forma que as nações possam adotá-la rapidamente. Se não puder haver uma governança global então que haja meios para um mosaico de medidas regionais e nacionais se somarem para permitir progressos significativos. E ainda acrescentaria um reconhecimento generalizado de que o planeta funciona como um sistema biofísico e deve ser administrado como tal.

Qual sua opinião sobre o texto base da Rio+20?
As metas globais de energia são bastante louváveis e factíveis. A agenda da economia verde é muito importante. Não está claro o que poderá acontecer em termos de governança global. A questão da biodiversidade está praticamente ausente [das pautas] de uma maneira direta. Em geral, a escala dos passos propostos ainda é insuficiente em relação aos problemas.

Como setor empresarial e sociedade civil podem contribuir para a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável?
Eu não tenho muito a sugerir especificamente, mas além daquilo que as empresas podem fazer em termos da sustentabilidade de suas próprias operações, poderiam ainda se envolver em cooperar de forma ativa com a sociedade civil, que é basicamente quem tem o conhecimento relevante.

Qual o papel das economias emergentes - como os BRICS – no impacto e nas soluções para as questões ambientais?
Os quatro países BRICs são muito diferentes em termos de trajetórias de desenvolvimento e conseqüente abordagem da sustentabilidade. O Brasil está em uma posição muito especial em função de sua situação favorável como um todo em relação às energias renováveis, grande gama de biodiversidade, e o excelente estado da arte da ciência brasileira. Espera-se que na Rio + 20 o Brasil exercer um papel enérgico e positivo, como fez na Rio 92.

Qual a viabilidade da estruturação da chamada “economia verde”? Uma ‘economia azul’ seria também importante?
É bastante viável estruturar uma economia "verde", mas a transição vai depender de uma grande dose de vontade e apoio político. Suponho que uma economia "azul" refira-se a uma atividade econômica que tenha um efeito positivo sobre a água e a hidrologia. Devemos sempre nos lembrar que a água doce não é apenas um líquido mas também um habitat muito importante para a biodiversidade de água doce.

Num enfoque direcionado ao acesso dos cidadãos a comida, água, energia, como governos e sociedade devem olhar para o meio ambiente? Qual é a solução de futuro para a Amazônia, o Brasil e a América Latina?
Boa parte de tudo isso tem a ver com o respeito à natureza, com uma definição de qualidade de vida que seja boa para as pessoas e muito melhor para o ambiente do que é o consumismo desenfreado, cujo melhor exemplo está nos Estados Unidos. Este é um modelo que, enfim, está simplesmente fadado ao fracasso. Também é muito importante administrar o meio ambiente e as atividades humanas como um sistema e por meio de planos integrados. Isso é tão verdadeiro para a Amazônia em geral quanto para as nações individuais. Isso significa reavivar o Tratado de Cooperação Amazônica e adotar abordagens regionais semelhantes. A melhor medida de sucesso será o quanto da biodiversidade do Brasil, da Amazônia e da América do Sul irá sobreviver. A melhor forma de medir o impacto ambiental é, afinal, através da diversidade biológica.
Thomas Lovejoy
© Thomas Lovejoy
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