Entrevista: Oded Grajew
junho, 05 2012
O engenheiro Oded Grajew dedica-se atualmente, entre outras atividades, ao Fórum Social Mundial e ao Conselho Consultivo do Global Compact, programa desenvolvido pelo ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, que procura mobilizar a comunidade empresarial internacional na promoção de valores fundamentais nas áreas de direitos humanos, relações de trabalho e meio ambiente.
O período que separa a Rio 92 e a Rio+20 viu surgir a cultura de responsabilidade social empresarial, que abriga iniciativas das companhias privadas que possam reverter em favor dos empregados e da comunidade, em torno de valores e causas como a sustentabilidade das atividades produtivas e a preservação do meio ambiente.No Brasil, um dos personagens centrais para o desenvolvimento do conceito foi o engenheiro elétrico Oded Grajew, que iniciou sua vida empresarial nos anos 1970 inovando com uma fábrica pioneira de brinquedos e de jogos inteligentes para crianças e adultos. Na década seguinte, de redemocratização do país, se dedica ao associativismo empresarial e aproxima o mundo corporativo dos movimentos sociais ao fundar e coordenar o Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE).
Atualmente, entre outras atividades, ele se dedica ao Fórum Social Mundial e ao Conselho Consultivo do Global Compact, programa desenvolvido pelo ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, que procura mobilizar a comunidade empresarial internacional na promoção de valores fundamentais nas áreas de direitos humanos, relações de trabalho e meio ambiente.
Com essa bagagem e militância, Oded Grajew sabe do papel central da classe empresarial em favor da conservação ambiental e espera que a Rio+20 ajude a colocar na agenda brasileira e na agenda internacional “todas as questões que envolvam a sustentabilidade”. A seguir os principais trechos da entrevista que concedeu ao WWF.
O que o senhor fazia à época da Rio 92? Recorda-se de algum episódio que marcou aquela conferência?
Naquela época eu estava na fundação Abrinq [Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos], tinha o PNBE [Pensamento Nacional das Bases Empresariais] e não estava envolvido com a Rio 92. São duas coisas que eu me lembro, a primeira é a quando eu era coordenador geral do PNBE, naquela época, e era a única entidade empresarial que estava envolvida no processo de mobilização pelo impeachment do [presidente Fernando] Collor. A questão ambiental que era uma coisa muito nova para o Brasil naquela época, porque todas as discussões brasileiras eram focadas nas questões sociais, na questão da crise econômica e na política.
Passados 20 anos, as empresas inseriram, pelo menos em discurso, uma preocupação com a sustentabilidade. A sustentabilidade se tornou um valor?
Virou. Não existia a expressão “responsabilidade social empresarial” e muito menos o conceito e a cultura. O que tinha no máximo era uma cultura de filantropia nas empresas, onde a empresa separava algum recurso e aplicava em projeto social. Hoje essa cultura foi implementada, não há empresário médio ou grande que não tenha discurso sobre a responsabilidade social e também da sustentabilidade, pois as duas andam juntas. Uma empresa socialmente responsável é uma empresa que procura se desenvolver de uma forma sustentável; são sinônimos do mesmo conceito. Agora existem vários graus de envolvimento e de compromisso das empresas: tem aquelas que ficam com discurso, aquelas que com algum projeto mais filantrópico social e tem aquelas que estão na vanguarda, que incorporam a responsabilidade social ou a sustentabilidade em seus instrumentos de gestão; assim, há variação de grau de comprometimento concreto.
Que expectativas tem em relação a Rio+20?
Primeiro, do lado de governos, acordos governamentais, a minha expectativa é muito baixa, porque vários governos importantes, especialmente da Europa e EUA, estão muito mais com a cabeça na crise financeira e na crise econômica e até têm dificuldade em mostrar um compromisso com a sustentabilidade. Segundo alguns países importantes como Alemanha, França, EUA, estarão saindo ou em meio a um processo eleitoral e, assim, os governos têm receio de colocar alguma coisa, uma mudança decisiva no modelo de desenvolvimento. Além disso, todo o processo de acordos é um processo que envolve unanimidade, tem que ter todo mundo de acordo, o que geralmente rebaixa para o mínimo de denominador comum. Então, da parte de governos, é uma expectativa muito baixa.
Agora vai ser importante porque vai ajudar a colocar na agenda brasileira e na agenda internacional todas as questões que envolvam a sustentabilidade, então vai poder avançar no sentido da sociedade toda se debruçar, informar e preocupar com essas questões no Brasil e no mundo, tendo muita cobertura dos meios de comunicação que certamente vai ajudar a avançar a agenda no sentido de envolvimento da sociedade civil e das empresas. Também vai ser muito importante na Rio+20 a visibilidade de quem já faz ou quem está na vanguarda, praticando os conceitos mais modernos de sustentabilidade.
Teremos muitos exemplos de empresas engajadas mundo a fora na Rio+20?
Sim, vamos ter. Algumas empresas vão utilizar isso como marketing, e tem pouco para mostrar de conteúdo; outras que tem mais a mostrar, um engajamento mais completo; vai ter de tudo. Isso virou inclusive valor para as empresas, ter valor de marca. As empresas perceberam que isso é importante para suas ações, mostrar o que elas estão fazendo em termo de responsabilidade social, vão procurar mostrar isso para procurar se diferenciar e vai ter muita cobrança. Vários movimentos sociais vão tencionar e pressionar para avançar mais rapidamente, para que governo, sociedade e empresas se engajem mais na sustentabilidade.
Essas experiências empresariais exitosas podem ser apontadas como legado da Rio 92?
Certamente podem. Vinte anos é muito tempo e bastante coisa aconteceu. Hoje o mundo da comunicação, as informações circulam muito mais rapidamente, a sociedade se informa e conhece muito mais a respeito de tudo, inclusive sobre as empresas. O setor empresarial é um setor muito poderoso na sociedade, um setor de muita visibilidade, muitos recursos financeiros e econômicos, é um setor que tem a mídia na mão, por ser um grande anunciante, um setor que financia campanhas eleitorais e políticos. Então os olhares da sociedade aumentaram muito sobre as empresas e as exigências e expectativas em relação a empresa. Já que o setor tem muito poder e muitos recursos, a sociedade demanda muita responsabilidade e da mesma forma a sociedade se mobiliza em relação as empresas, tanto para pressionar, quanto para rejeitar ou apoiar.
Qual sua opinião sobre o texto base da Rio+20?
O que chama a atenção é que existe uma falta de sincronismo com as urgências, de repensar o modelo de desenvolvimento e o real compromisso, a visão dos governos do que tem que ser feito, do que é necessário fazer. É um texto muito pobre em relação a aquilo que se espera que governos façam e sua visão em relação a que é necessário fazer. Não é um texto que fundamentalmente questiona o modelo de desenvolvimento que tem levado o mundo ao estado atual. Também faltam no texto reais compromissos com o modelo de desenvolvimento sustentável, de compromissos concretos.
Qual a viabilidade da estruturação da chamada “economia verde”?
Quando você se propõe a traduzir o discurso em ações concretas, na realidade tem que assumir compromissos com mudanças; estabelecer metas e valores. Um exemplo de compromisso com a mudança seria, aqui no Brasil, colocarmos em votação no Congresso Nacional a proposta de emenda constituição 52/2011 que estabelece a obrigatoriedade para presidente da República, governadores e prefeitos estabelecerem metas para suas gestões baseados no desenvolvimento sustentável. Conforme a proposta, 90 dias após a posse, eles têm que apresentar metas e números em relação a todas as áreas da gestão pública e a todas as regiões que estão sobre sua governança.