Congresso poderá investigar os bastidores que levaram à extinção da Renca

setembro, 14 2017

Já haveria 172 assinaturas de deputados dispostos a investigar por meio de uma comissão de inquérito
por WWF-Brasil
 
A oposição mandou hoje um recado ao governo. Vem aí uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) formada por deputados e senadores para investigar a recente decisão do Ministério de Minas e Energia de extinguir a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca).
 
 A reserva minerária localizada entre os estados do Pará e o Amapá estava vedada à mineração desde 1984. No final de agosto, o governo Temer publicou um decreto liberando ao setor privado a pesquisa mineral na região, onde antes apenas o governo podia exercer a atividade. A Renca tem 47 mil quilômetros quadrados de extensão.

O anúncio da abertura da CPMI foi feito nesta quinta-feira (14) pelo deputado Alessandro Molon (Rede/RJ) durante audiência pública na Câmara dos Deputados para discutir os efeitos da extinção da Renca. Líder da Frente Parlamentar Ambientalista, Molon garantiu já ter assinaturas de 172 de deputados favoráveis à abertura da CPMI.
 
Faltariam apenas 28 adesões de senadores para o Congresso Nacional criar a CPMI e investigar os motivos que levaram o governo a destravar a Renca para a iniciativa privada. “Queremos saber o que está por trás da Renca”, disse Molon. Para ele, o decreto do governo gerou desconfiança na sociedade.
 
“A decisão foi tomada sem nenhum debate com a sociedade, os cientistas e as ONGs. Os empresários foram avisados antecipadamente da extinção da reserva e ainda houve um parecer contrário do Ministério do Meio Ambiente alertando sobre os riscos sociais e ambientais da medida”, lembrou Molon durante a audiência pública. Mas o governo foi em frente, alegando estar em busca melhorar a economia do país.
 
A audiência pública desta quinta-feira foi convocada pelo deputado Nilto Tato (PT/SP) com o objetivo de ouvir o governo e a sociedade sobre a medida. Desde que foi anunciada, a extinção da Renca gerou protestos dentro e fora do Brasil. Foi uma torrente de manifestações contrárias, que surpreendeu o governo.
 
 Ambientalistas, entidades ligadas aos direitos indígenas, artistas, pesquisadores, ONGs. A críticas vieram de todos os lados. A pressão é para o governo revogar a medida. O governo, porém, segue o intento de manter a abertura da área para a mineração industrial. "A resistência do governo em revogar este decreto aumenta a nossa suspeita”, comentou Molon.
 
Depois da onda de repercussão negativa, a única atitude do Ministério de Minas e Energia para apaziguar os ânimos foi divulgar uma nota dizendo estar disposto a estimular “um amplo debate” sobre as alternativas para a proteção da região.
 
“Essa iniciativa se dá em respeito às legítimas manifestações da sociedade e a necessidade de esclarecer e discutir as condições que levaram à decisão de extinção da Renca”, diz a nota.
 
Ainda de acordo com o comunicado, ficou estabelecido o prazo de 120 dias para o MME apresentar ao governo e à sociedade as conclusões do debate e eventuais medidas para "promoção do desenvolvimento sustentável, com a garantia de preservação”. Até o fim desse prazo, ficam suspensas as análises de processos minerários para a região contestada.
 
Longe de acalmar a situação, essa estratégia do governo gerou ainda mais descontentamento. A deputada Janete Capiberibe (PSB/AP), resumiu: “é incorreto decidir um projeto dessa dimensão sem envolver o Congresso e a população nesta discussão e agora chamar a sociedade para discutir”.
  
Colaterais
 
“Ficou claro para a sociedade que a suspensão da Renca poderia trazer efeitos indesejados para o meio ambiente, os povos indígenas e comunidades extrativistas da região”, lembrou Michel Santos, coordenador de Políticas Públicas do WWF-Brasil, durante a audiência na Câmara.
 
Ele lembrou que na área da Renca existem nove áreas protegidas, sendo duas terras indígenas e sete unidades de conservação de proteção integral e de uso sustentável.
 
“Simplesmente atrair investimentos sem criar salvaguardas para a proteção socioambiental pode gerar conflitos e novas tensões na área”, advertiu o ambientalista.
 
Embora proibida para mineração, a região atraiu milhares de garimpeiros ilegais que adotam práticas predatórias, como o uso do mercúrio usado no processamento do ouro.
 
Esse mercúrio é despejado nos rios, contaminando as águas, os peixes e, provavelmente quem os consome. Estima-se que cerca de mil garimpeiros atuem clandestinamente na região. Vinte e oito pistas de pouso para aviões usados na pilhagem do ouro foram identificadas recentemente naquele trecho da floresta amazônica.
 
A área ocupada pela Renca está em bom estado de conservação. Segundo dados do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) o desmatamento na área ocupa apenas cerda de 1% da floresta.
 
Durante a audiência, a diretora do Departamento de Sustentabilidade do Ministério de Minas e Energia, Maria José Salum, reconheceu que a ausência do Estado favoreceu a garimpagem ilegal do ouro na Renca nas últimas décadas. “Queremos paralisar imediatamente esses garimpos”, afirmou. Segundo ela, as empresas teriam o condão de afastar os garimpeiros.
 
Mas essa tese não encontra adeptos, além do governo.
 
“Com a eventual chegada das empresas para ocupar os melhores nichos de mineração, há o risco de os garimpeiros ilegais serem empurrados para o interior das áreas protegidas, agravando ainda mais os conflitos e colocando essas áreas sob pressão”, alertou Jaime Gesisky, especialista em Políticas Públicas do WWF-Brasil.
 
Ele foi o responsável por um relatório divulgado em julho deste ano que antecipou as intenções do governo em promover mudanças na Renca. Desde então, o WWF-Brasil vem alertando sobre os riscos da medida.
 
Para o WWF-Brasil o governo precisa apresentar um plano mais apropriado para induzir o desenvolvimento sustentável na região, incluindo as populações locais ao processo produtivo, combatendo a garimpagem ilegal e outras formas de intervenção que causam degradação e desmatamento na Amazônia.
 
 
 
WWF defende projetos sustentáveis para a região da Renca.
© WWF-Brasil
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