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COALIZÃO PELA VIDA 

Construção de base de monitoramento, aquisição de barcos, melhoria na comunicação e aliança com ribeirinhos estão entre as ações concretizadas em parceria com o povo Yawanawa

 
 
20 de maio de 2020

 

Quem navegou rumo às aldeias Yawanawa em agosto e setembro de 2019 se surpreendeu com a quantidade de áreas desmatadas e queimadas às margens do rio Gregório. Esse tipo de degradação, mais frequente ao longo de estradas, se tornou comum a partir da posse de Jair Bolsonaro na Presidência da República e de Gladson Cameli no Acre, o primeiro governador eleito no estado - depois de 20 anos de gestão do PT - com discurso voltado ao agronegócio.

A Terra Indígena Rio Gregório, habitada principalmente pelo povo Yawanawa, é justamente uma das áreas protegidas mais pressionadas do noroeste do Acre. Ao todo, a reserva tem 187 mil hectares de floresta com rica diversidade de fauna e flora. É repleta de madeira nobres. E, por estar perto da rodovia BR-364, é alvo fácil da invasão de madeireiros.

A região é cobiçada há muitos anos. Não é à toa que há projetos prevendo para 2020 a concessão de florestas públicas estaduais para manejo madeireiro sustentável em áreas vizinhas à Terra Indígena, como na Floresta Estadual do Rio Gregório. Para os Yawanawa, isso tem potencial para atrair mais invasores para explorar ilegalmente suas terras.

A procura por madeira, a caça e a pesca ilegais, além do afrouxamento das políticas de fiscalização ambiental pelos governos federal e estadual, são as principais ameaças à TI, que está localizada no município de Tarauacá. Incentivados pelos discursos do governo local de que as multas ambientais não deveriam mais ser pagas, muitos produtores rurais não mediram esforços para abrir novas áreas para a agricultura e a pecuária.

Até bem pouco tempo atrás, a conservação da floresta em Tarauacá não era motivo de preocupação. Mas, em 2019, o município ficou em terceiro lugar no Acre no ranking do Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), com 722 focos de calor registrados entre janeiro e dezembro. Para o povo Yawanawa, a proximidade da BR-364 é o principal vetor do aumento do fogo.

“Os cenários que nós temos para os próximos anos não são nada positivos. No plano federal, temos um presidente claramente contrário às pautas indígenas e, aqui no Acre, um governo que tem um objetivo bem definido: privilegiar apenas o agronegócio”, acredita Joaquim Yawanawa, uma das lideranças do povo.

A SEGURANÇA DA FLORESTA

Manter a floresta viva é assegurar não apenas a segurança alimentar, mas também a segurança financeira das 1.250 pessoas que vivem na TI Rio Gregório. Por meio do etnoturismo, os Yawanawa abrem as portas de suas aldeias para turistas de todo o mundo interessados em conhecer o modo de vida na floresta. Um dos principais atrativos é a espiritualidade, demonstrada em rituais como com ayahuasca e rapé, ambos produzidos a partir de espécies vegetais da Amazônia. Todos os anos, festivais são realizados para mostrar as celebrações passadas de geração em geração.

Por muito pouco, essa tradição não foi extinta a partir da chegada dos “brancos” à região, na primeira metade do século passado, para a extração da borracha. Com a falência da economia extrativista, missionários evangélicos substituíram os “patrões”, levando os indígenas a perderem suas práticas espirituais de relação com a floresta. Mas, graças à memória e à persistência dos mais velhos, a ancestralidade foi recuperada. Agora os Yawanawa lutam não apenas para manter o seu modo de vida como também para preservar o seu território.

A parceria com o WWF contribuiu para montarmos uma base de vigilância na entrada do território, que está servindo tanto para os Yawanawa quanto para os nossos vizinhos. Assim, ficou mais fácil monitorar a entrada e a saída de barcos, diz Joaquim Yawanawa.

PROTEÇÃO TERRITORIAL NO FOCO

Para lidar com o recente aumento da pressão sobre a Terra Indígena Rio Gregório, o WWF-Brasil e a Associação Sociocultural Yawanawa (ASCY) firmaram uma parceria visando melhorar a comunicação, com a instalação de internet nas aldeias, e a gestão territorial. Equipamentos como cinco barcos e três motores de popa foram adquiridos para fortalecer o monitoramento na reserva. Pelo menos 1.250 pessoas estão sendo diretamente beneficiadas e outras mil, indiretamente - em uma área de 280 mil hectares. A expectativa é de que, com isso, a proteção contra pescadores e caçadores ilegais, assim como madeireiros, aumente.

Joaquim ressalta que o apoio do WWF-Brasil foi decisivo para a formação de uma coalizão dos povos da floresta. “Pela primeira vez na história, houve uma reunião entre os ribeirinhos e os moradores da Terra Indígena. Criamos uma aliança para preservar as adjacências do rio”, conta. “A parceria com o WWF também contribuiu para montarmos uma base de vigilância na entrada do território, que está servindo tanto para os Yawanawa quanto para os nossos vizinhos. Assim, ficou mais fácil monitorar a entrada e a saída de barcos”.

A melhoria da relação entre os indígenas e as famílias ribeirinhas que vivem no entorno da reserva foi importante porque uma das principais preocupações na região é o uso do fogo por esses vizinhos durante a limpeza de seus roçados e a abertura de novas áreas para a agricultura. O objetivo foi conscientizá-los sobre os riscos das queimadas e do desmatamento para a conservação das maiores riquezas locais: a floresta, o rio Gregório e os povos que ali habitam.